..::Live and let...::...
Viver não dói.
Um coração que bate. O pulmão que se infla, se enche de ar. A boca que saliva o desejo, sangue (es)correndo nas veias, órgãos, massas, pele, pêlos... Sujeira em meio à aparente higiênica beleza... Uma dependência interdisciplinar. Uma massa disforme que uniformiza toda a máquina.
Viver, nem dói.
Acordar. Abrir. Esticar. Levantar. Trocar. Tomar. Arrumar. Escovar. Sair. Correr. Uma marcha mecânica que nem percebemos fazer todas as manhãs, quase que religiosamente. Sacramental.
Viver... Não dói.
São só sonhos, anseios, vontades. Frustrações, amores, brigas, entendimentos. Faz as pazes, abandona, esquece, conquista. Compra, mata, perde, reabilita. Acha, intriga, come, sacia. Apenas quer, ordena, somente traz, dilemas. Busca a liberdade de estar para sempre preso, procura em si o que não encontra nos outros, caça nos outros tudo o que falta em ti.
Viver não dói.
O que dói é a consciência do estar vivo.
Lua Aaliyah
...::Almoço em Família::...
Se fecha no quarto pra esconder a tristeza
Talheres, risadas, mentiras sem fim
Não é muito o que peço, sossego e descanso
Fique apresentável, sorria e venha pra cá
Falsidade no ar, um cheiro de queimado
"Quando é que você vai arrumar um namorado?"
Não existe
É loucura esse mundo à parte
O parto, as fotos, são vídeos covardes
As roupas, o verbo, as poses, e aí?
São meros disfarces, cobranças ruins
Avisa quando estiver com fome
Vai lá e compre, mostre o que tem
Competindo, provando tudo a ninguém
Se volta, pondo o blues pra rolar
Se cobram ou jogam na mesa as respostas do mundo
Se aumenta o volume e dá um soco no muro
Cuidado com a criança dormindo no quarto ao lado...
Se fecha no quarto e chora sem fazer barulho...
Lua Aaliyah
...::Sexo, Mentiras e VideoTape::...
- E por quê tantos vídeos?
- É minha forma de passar o tempo...
- Que tal assistirmos algum?
- Hum... Não...
- Por quê? O quê tem neles? Rsrsrs.. São pornográficos?
- Apenas entrevistas... Mas prometi a cada uma das entrevistadas que ninguém veria as gravações além de mim...
- Entrevistas com mulheres? Wow... Sobre o quê?
- Sobre sexo...
- ...
***
- Ela sempre foi puritana demais para admitir qualquer coisa.
- Mas ela ficou bem curiosa...
- Isso não quer dizer nada. Entrevistas? Aposto que ela ficou calada quando soube... Mas, por quê entrevistas sobre sexo? É assim que você conquista suas mulheres?
- Não... Mas... Melhor, por quê você não grava uma?
- Você vai me perguntar coisas? Vai me questionar?
- Não... Ligo a câmera. Você fala... Gostos, experiências... A câmera é apenas um espelho. Há mulheres que tem fitas de apenas alguns minutos. Outras, horas. Você é livre...
- Quero.
- ...
- Você vai ficar calado enquanto arruma tudo?
- ...
- O que faço agora?
- Sente-se no sofá como achar melhor. Fique confortável. Se quiser, pode tirar os sapatos. Diga seu nome, e depois, fique à vontade... 1...2...3... Pronto...
- Bem... Meu nome é Ana. E é muito estranho estar aqui para falar de sexo. Para um ilustre mal conhecido vizinho de minha irmã puritana. Eu não. Sou diferente dela...
- Diferente?
- Ela não assume do que gosta. Aliás, nem sei se gosta. Não fala, nem sei se faz. Eu não. Eu gosto. Um homem é para mim algo sempre novo. Sempre algo a mostrar, a me proporcionar. Gosto de seduzi-los. De senti-los em mim. Não sei bem explicar por que eles me deixam tão... Faz calor não é?
- Não sinto...
- Eu sinto... E gosto de sentir... De seduzir.. Estou me repetindo... Mas, é mais intenso e forte do que eu... Mãos que passam dessa forma no meu corpo... Um transe de pele, cheiros, líquidos e palavras. Algo que parte daqui, da boca, e vai percorrendo tudo... Descendo... Com as mãos... Tomando conta do corpo, da mente, até que desce mais e chega na...
***
- Você gravou um vídeo com ele?!?
- Ah mana... Não foi assim tão... ruim! Pelo contrário...
- Ele é um pervertido!... Mas ele.. Ele tocou você?!?
- Não...
- Você tocou ele???
- Hmmm... Também não...
- Por favor, alguém tocou alguém???
- Hmmm... Bem... De certa forma... Sim...
- Oh.. você não fez...
- Fiz! E foi mui..
- Eu não quero saber!
***
- Apenas uma entrevista...
- Ela é uma ninfomaníaca... Você um pervertido. Se merecem!
- Você me acha pervertido? Não tenho nada com ela. O que você pensa de mim?
- Eu acho... Você na verdade... Eu queria dizer que... Espere! Essa é a câmera? Esse é o vídeo?
- Sim...
- Quanto.. Quanto tempo ela ficou aqui?
- Uma hora e meia falando...
- Nossa... Isso tudo? E acho que ela sequer falou a metade... Não seria capaz de permanecer por 10 minutos!
- Eu não sei.
- O que você...?
- ...
- ?
- Apenas... Respire...
- Meu nome é...
...::Projeção::...
"Too many guys think I'm a concept, or I complete them, or I'm gonna make them alive. But I'm just a fucked-up girl who's lookin' for my own peace of mind; don't assign me yours... I´m not perfect!"
- A verdade é... É que eu esperava outra coisa de você, sabe. Mas tudo bem... Ainda é tudo meio estranho, não sei bem como agir. Perdão por me afastar, mas agora acho que preciso disso. Não esperava que fosse ser assim... Mas eu estava me magoando...
Apenas disse tais palavras, levantou-se da areia e foi-se embora.
E mais uma vez acontecia, e outra amizade partia, modificava ou simplesmente se esvaía.
Ela nunca quis nada disso... Nunca quis magoar, ferir ou sequer despertar algum sentimento. Mas parecia incrível, antes de perguntarem dos sonhos, dos planos; antes de conhecerem o real jeito insone de ser que tinha, projetavam na aparente liberdade de agir a salvação das prisões mentais deles. E quando ela tomava a atitude que não mais condizia com tudo o que esperavam, decepcionavam-se e a tinham por estranha. Iam embora. Não era a primeira vez.
Talvez demorasse alguns dias até que ela digerisse tudo. Provavelmente acabaria escrevendo mais um livro, e usaria isto como tema em um de seus capítulos.
Parecia bobagem, mas era importante pra ela. Podia não ter a importância de alguém especial, mas tinha. E agora; e se ela tivesse alguém especial? Como contar? Magoaria? Era difícil perder mais uma pessoa...
- Mas moça, você sumiu. Estava acostumado a te ter perto todo dia, conversando. Sempre rindo, parecia a única a me entender. Não nego que sinto falta, ha tempos não conversamos horas e horas... Não, não tenho mais ninguém. Só conversava com você. Achava que você podia me ajudar. FAzer com que eu ficasse melhor. Desculpe ter ficado tão dependente, mas eu achava que a gente... Deixa pra lá.
E tentava desviar o assunto, ou ria... Mas era notório que estava desconfortável. Ela mais ainda. Aflita. Ela não era a salvação nem dela mesma. E quem perguntaria a ela o que ela sente? O que ela quer? Diria a quem, para não parecer provocação?
- Eu nem te chamei pra sair. Você se quiser que me chame. Mas.. Não demore. Estou ficando ansioso. Talvez você não queira gastar seu tempo livre comigo...
Não havia andiantado fugir, ficar, ser educada, gritar, maltratar, ignorar nem simplesmente deixar pra lá. Dizer com todas as letras, e nem silenciar. E se cobravam, o que ela faria? Não entendia, pois não era tão singular assim...
- E como você não foi, ele também não foi. E o vi com cara de choro, estava até meio chato naquele dia. Poxa... Vocês se dão tão bem. Essa amizade... Por que não?... Até meio grudento... Enfim... Vai lá e explica de novo que a verdade não é bem essa aos amigos dele, pois todo mundo acha que vocês dois estão mesmo!
E ela explicava. Ela sabia o que achavam, mas quem se importa? Mas explicava o que era fato e o que era desejo dos outros.
E ela queria ficar sozinha, quieta, em casa, no quarto. Escrevia frases sem sentido em seu caderno. Mais perdas de coisas pequenas... Muito trabalho, muita cobrança, pouco ar. Sufocava.
- Fica bem, minha moça...
Mas às vezes ela recebia novo ar pra respirar...
"Muitos caras acham que sou um conceito, ou que eu os completo, ou que eu vou fazê-los (sobre)viver. Mas eu sou só uma garota ferrada procurando paz de espírito, não me faça a sua. Não sou perfeita!"
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