O dia em que não fiz uma tatuagem como forma de rebeldia

"Feita de música, luar e sentimento..."
Eu sempre quis fazer uma tatuagem. Já tive trocentas ideias, mudava a cada semana, mas um dia li essa frase e me encantei com ela. Estava decidida. Iria fazer no ombro. Pronto.
Mas... Fui deixando para depois, adiando, inventando alguma desculpa, falta de grana, falta de tempo, o desenho que não era legal, o traço, tudo, e não fazia a tal tatuagem. Até que me perguntei porque, e entendi que não havia motivos para não fazer. Só que não havia também motivo algum para fazer.
Por que, qual a ideia básica de alguém que decide fazer uma tatuagem? Ser diferente. mas, pensando bem, em dias como agora, diferente de quem?
Não entendo essa obsessão das pessoas hoje em dia em serem diferentes. E muito menos como essa paranoia toda começou. Incrível o tempo e energia que vejo desperdiçarem querendo ser diferentes, únicas. Mas no fundo, parecem não perceber que estão cada vez mais iguais. Acontece que eu percebi que o que faz alguém diferente não é ela ter um corte ou uma cor de cabelo ousada, uma, duas ou mil tatuagens, piercings, body arts, uma maquiagem chamativa, uma roupa diferente  ou qualquer coisa do tipo. O mundo é - e sempre foi, na verdade - uma soma desses elementos.
O que faz de mim uma pessoa diferente é o que eu sou enquanto pessoa.
"Passo tanto tempo querendo ser quem eu sou e ficam vocês querendo que eu seja como eles..." 
Li em um libro sobre ele e essa frase sempre me acompanhou.
Deixa explicar: é meu jeito de pensar, de agir. (Acho que) o que faz de mim ser diferente é jogar o lixo no cesto e não no chão. É dar bom dia ao entrar no elevador. É perceber que minha colega de trabalho está passando por dificuldades e levar um chocolate pra ela. É pensar por mim mesma e defender minhas opiniões, mas respeitar a daqueles que pensam de outra maneira. 
No fim das contas, é isso que vai ficar no mundo quando eu me for.
"Mas isso é tão clichê!"
Claro que é!!! Tanto quanto ter uma cereja tatuada no ombro ou três estrelinhas na nuca, atrás da orelha. Mas a questão não é ser clichê. É ser rebelde. E, para mim, pintar o cabelo de vermelho, usar determinada roupa ou fazer uma tattoo não é sinônimo de rebeldia. 
"Ah, mas tem toda uma simbologia, uma história, um marco..."
Aí é outro departamento. Se na sua vida aconteceu uma tragédia ou uma alegria muito grande, algo que de tão excepcional e importante te marcou - literalmente - na pele, a tatuagem ganha outra dimensão. Aqui não é mais ser diferente, único ou rebelde. É ter algo para lembrar a si mesmo. E eis mais um motivo que não tenho para desenhar meu corpo. Não tenho nenhum marco assim na vida.
Por outro lado... Vejo cada vez mais vejo asas, pássaros, plumas e símbolos de infinito em pulsos, ombros, nucas e outras partes corporais por aí afora... Será mesmo o quesito "liberdade" algo tão marcante assim? Ou antes, será mesmo que você, tão livre e dono de suas decisões, precisa mesmo de uma tatuagem que mostre pro mundo o tamanho de sua liberdade? Por que, vejo crescer esse enorme exército de mentes "livre-pensantes" que no fundo, me lembram um pouco aquele clipe de Another Brick on the Wall, mas com tatuagens de pássaros fugindo de gaiolas no lugar dos fardamentos. 
Que liberdade é essa que não se realiza se não for exposta e exibida ao mundo? E aqui, talvez, a gente volte ao começo do texto: isso é ser diferente? Mas, diferente de quem?
Então, ao passar na porta do estúdio de tatuagem, olhei para o letreiro, sorri para quem estava lá dentro, respirei fundo, e segui meu caminho. Como uma rebelde - e com causa: a de continuar sendo quem eu sou. 
Quem é? O que é? Tento dizer o que me falta e o que (não) digo falta me faz. Mal as palavras sobem-me à garganta engasgam, saem mortas ou, se (sobre)vivem, perdem-se. Sim! perdem-se de mim e eu me perco delas. Logo "perdem-se" elas novamente em encontros futuros... Não sou dono de minhas próprias palavras! Queria poder dizer, mas não há palavras. É preciso criá-las, é preciso um meio; um meio de dizer sem "palavras". O silêncio me é amigo. o silêncio me é companheiro. Tão importante quanto sentir, tão importante quanto o não dito, tão importante quanto a nota perdida, a nota encontrada, o acorde consonante e dissonante. Sou? Não sou (?). É preciso dizer com o silêncio. Não há palavras, é preciso dizer com literatura. O que sou? Quem sou eu? 
Um enigma!

.: Autor Desconhecido :.
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