"Christmas, Christmas time is near
Time for toys and time for cheer"
Fim de ano. Como sempre aqui, atrelado a mesa, com um lindo e mimoso presentinho sobre ela, muito bem embrulhado com um laço azul, feito por mim, não consigo fugir à isto tudo, esta coisa de espírito natalino.
Mas o que seria isso? Conheço espíritos de porco... Ou o espirituosismo de falsos entusiastas... Espíritos da cara branca de talco que mal assustam criancinhas de 3 anos de idade... Mas estar no espírito do natal...
Se eu entender por isso pessoas correndo malucas às lojas, entupindo as filas de presentes mal pagos pra pessoas mal amadas, bom, isso se assemelha a qualquer filme hollywoodiano que se passe nesta época. Tanto faz se comédia pastelão ou romântica, e bom, esse espírito verde, branco e vermelho de pinheiros com coca-cola está por todos os lados, confesso.
Mas pode ser "espírito" algo tão "material"?
"- Ô seu moço! Me dá dois espíritos natalinos aí, embrulhados pra presente!!!"
***
E lá ia eu, apressado entre as pessoas, com pacotes e sacolas nas mãos.Refazia a lista, via se não tinha esquecido de ninguém. Não, não, estava tudo certo, estava tudo ali.
Via meio que fascinado todas aquelas luzes... Ah, disso sim gostava... As luzes! Que juntamente com aquela brisa noturna dava um ar romântico e um certo charme e graça àquela época do ano. Mas que raios as pessoas insistem em esbarrar na gente, apenas para le,mbrar que aquele mundo real existe no meio das luzinhas!!!
Toca pra casa que é melhor.
Mas antes passar na casa da prima, deixar os pacotes que ela pediu pra comprar. Biscoitos, chocolates e um bom vinho. Seria muito chique a ceia dela. Tem de ir à redação, deixar as castanhas e a camiseta que a cristina, a estágiária - ia dar de presente ao namorado que ela arrumou faz nem três dias, e ela pediu que eu cmprasse por que ela não teia tempo de ir fazer as unhas e comprar o presente. (Estranho essa das pessoas procurarem desesperadas companhia nesta época do ano) Passar também na casa da Rita, vizinha do andar de cima, deixar os pacotes que ela pediu de castanhas e nozes, e este monte de panettone que ela vai dar às criancinhas no sinal... Tão boazinha ela...
Ufa... Cheguei em casa... 24 de dezembro de mais um ano como qualquer outro... O cheiro que vem dos apartamentos vizinhos aguça qualquer fome! Melhor cuidar em requentar o frango do almoço, abrir minha sidra e esperar na varanda do quarto de luzes apagadas a passagem do tal velhinho... Quem sabe ele me dê alguma razão de presente...
.:O Inferno São Os Outros:.
Fechava os olhos e continuava a correr...
Quando achava que o coração explodiria e a garganta se abriria para que os pulmões pudessem se expandir por ela, parava um pouco e andava apenas muito depressa naquela chuva fina que caía. nada de importante, apenas o suficiente para irritar pelas finas gotas que caíam machucando-lhe o rosto.
Apertava o passo, sem saber se iria chegar onde queria, ou onde queria chegar talvez fosse o que não sabia, mas trazia consigo os fones de ouvido e a surrada bolsa carteiro a tiracolo.
O barulho das ruas nem de longe diminuíam a sensação dos gritos em sua cabeça. Pedia por favor para pararem, mas aqueles gritos, e choros e apelos infantis não lhe deixavam pensar ou ouvir mais nada. Era mais que perseguição, estava em todo lugar.
Os fones agora eram inúteis.
Então acelerava, e acelerava, e a chuva antes fina parecia engrossar. Tal qual sua angústia diante daquilo tudo. E se chegasse em casa, o que encontraria? O que diria? Entraria sem dizer nada como o costume e enfrentaria aqueles pequenos olhares inquisidores a lhe questionar por onde andava?
E se não fosse para casa, o que lhe esperaria? Em que quarto se esconderia?
De olhos fechados continuava a correr. Poderiam pensar que era de ladrão, que perdera o horário, o ônibus, ou apenas tinha pura ansiedade, e corria. Agora molhava-se mais e mais naquela chuva, no calçadão da praia, a bolsa pesava embebida em toda aquela água, mas agora seu rosto era machucado pelo quente das lágrimas que desciam grossas por suas faces. Não saberia explicar o motivo delas, apenas sentia aquele aperto agoniante nos olhos, como se lavasse a alma de dentro pra fora enquanto a chuva lavava seu corpo de fora pra dentro. Era maior do que si. Mergulhava mais e mais naquela espécie de hipnose física: barulho de água nos ouvidos, coração acelerado da corrida, o choro das crianças em sua cabeça, as buzinas dos carros em seus ouvidos...
Não havia visto a reforma da calçada e menos ainda o buraco cheio de pequeninas pedras em seu caminho, inevitavelmente foi ao chão.
Agora sentia que parecia também uma daquelas crianças, e quis chorar mais ainda, olhando em volta todos lhe olharem. Apertou ainda mais os olhos, contendo tudo o que podia em si, concentrando-se para querer acordar se aquilo fosse um pesadelo.
Surpreendentemente a chuva cessou de vez, sendo substituída por um ar extremamente frio, as buzinas dissiparam-se, as pessoas não haviam mais; abriu os olhos já de volta à realidade branca e de paredes acolchoadas com cheiro de calmantes daquele quarto de hospital...
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